O Absurdo Existe

Por que nós ainda vemos apenas a ponta do iceberg

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Ciência e Fé


Um artigo publicado pelo físico Paul Davies em Novembro de 2007 no New York Times teve grande repercussão em blogs científicos, por tratar de um assunto polêmico: a fé na ciência. Você pode acessar uma versão em português em

http://g1.globo.com/Noticias/Ciencia/0,,MUL195628-5603,00-CIENCIA+E+UMA+QUESTAO+DE+FE+DEFENDE+PESQUISADOR.html

Vou destacar aqui um trecho que condensa um ponto de debate muito fértil.

Ao longo dos anos, perguntei diversas vezes a meus colegas físicos por que as leis da física são o que são. As respostas variavam de "essa não é uma pergunta científica" até "ninguém sabe". A resposta favorita é: "não há motivo para elas serem o que são. Elas simplesmente são". A idéia de que as leis existem irracionalmente é profundamente anti-racional. Afinal de contas, a própria essência da explicação científica de alguns fenômenos é que o mundo é organizado de maneira lógica e existem motivos para as coisas serem como são. Se alguém seguir as pistas desses motivos em todo o percurso até o fundamento da realidade, as leis da física, somente para descobrir que a razão naquele ponto nos abandonou, isso seria zombar da ciência.


Davies, autor de vários livros, é bastante conhecido por defender idéias cosmológicas que levam, de forma indireta, a posições favoráveis à existência de Deus.


Algumas críticas que são colocadas com relação a essa passagem é de que ela tentaria atribuir à ciência uma atitude que não é científica de fato. A ciência trataria apenas de modelos que se ajustem o mais adequadamente possível a dados experimentais. Não haveria sentido, ou seria inútil, tentar descobrir o que "realmente seriam" os objetos de estudo. No caso das leis da Física, essas tentativas é que seriam totalmente irracionais. Não haveria como ter respostas a estas perguntas. Essas questões já teriam sido feitas em épocas de obscurantismo, nas quais elas eram, de fato, as únicas indagações a respeito da natureza. Seria apenas uma espécie de contra-argumento à metodologia científica, afirmando que esta não leva em conta a verdadeira essência das coisas.

Eu discordo dessas críticas ao pensamento de Paul Davies. As questões que o físico levanta não devem, de forma alguma, serem interpretadas como uma mudança de metodologia da ciência; são simplesmente questões a serem respondidas. Se elas existem, e a ciência é incapaz de respondê-las, paciência. Elas continuam sendo questões. Se elas foram usadas em outras épocas, ou ainda são usadas contra a ciência, isto não altera a sua importância. O fato de pensamentos serem usados freqüentemente com retórica, para tentar demonstrar uma inverdade, não deve desqualificar o valor desses pensamentos.

Davies continua:

Será possível que a poderosa estrutura da ordem física que percebemos no mundo que nos diz respeito seja, em última análise, alicerçada em um absurdo irracional? Se sim, então a natureza é um embuste diabolicamente sábio: absurdo e ausência de sentido de alguma forma disfarçando uma engenhosa ordem e racionalidade.


Perceba a grande semelhança entre esta passagem e a idéia principal de meu Blog: o absurdo existe, e é a base, ou alicerce, de nossos fundamentos científicos mais estabelecidos. A ciência estuda, com seu método, a parte racional. A parte absurda estaria inacessível a qualquer formulação lógica.

É um grande erro entender essas afirmações como um desestímulo à busca das grandes verdades ocultas. Pelo contrário: deve ser um grande incentivo! Se certas coisas são misteriosas, para dizer o mínimo, nada como opiniões que destaquem suas propriedades bizarras, que seria uma forma de "misticismo" para alguns, para lançar vários focos aos problemas que são suscitados.

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Algumas objeções

Pensando desta forma, você não avançará na solução do problema da consciência. Mais que isso, será induzido a considerar a resposta impossível de ser obtida, se fechando a novos fatos.


- A atitude de considerar algo um mistério, ou absurdo, não é nenhuma violência contra as mentes científicas. Se a verdade for inatingível, e daí? Então, não podemos saber tudo e pronto, paciência. Quem disse que já existe uma regra que explicita que as verdades devem ser todas acessíveis? Considerar que possam existir fenômenos que não possam ser explicados pela lógica não deveria ser considerado uma atitude anti-científica em si, porque a própria ciência não dispõe de métodos para descomprovar essa afirmação. Deve ser, sim, alvo de contra-posições de cientistas. A minha atitude também é uma atitude cética, e não impedirá ninguém de ir mais a fundo na questão; pelo contrário, o incentivará a se aprofundar mais. A diversidade de opiniões em qualquer campo misterioso deve ser sempre bem-vinda.


Pelo jeito que você demonstra estar convicto de suas idéias, então deve se considerar uma autoridade infalível sobre sua própra mente...


- A única autoridade sobre minha própria mente que demonstro é a de que minha própria consciência existe. Isto não é uma intuição. A minha conviccão é de que a existência da consciência fere qualquer base lógica ou material que possamos desenvolver. É apenas uma opinião de que a resposta ontológica não pode ser respondida (ontologia é algo relacionado a perguntar "O que existe?")

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

A Neurociência ainda vislumbra

http://www2.uol.com.br/sciam/reportagens/como_a_consciencia_se_manifesta_.html
Este artigo publicado na Scientific American Brasil de Novembro de 2007, escrito por dois neurocientistas de calibre no campo de estudos da consciência, dá um exemplo de como se encontram as posições científicas com relação ao problema mais forte da consciência: o da experiência subjetiva. Susan Greenfield é diretora da Royal Institution of Great Britain, membro do British Parliament’s House of Lords, e professora da Universidade de Oxford. Christof Koch é um neurocientista com PhD em processamento de informação não-linear pelo Max Planck Institute, e professor do California Institute of Technology. Os dois são verdadeiras autoridades nesse campo de pesquisa.
O artigo já começa com as duas seguintes afirmações:

"A maneira como processos cerebrais se traduzem em consciência é um dos maiores desafios a ser resolvido pela ciência. Embora o método científico tenha conseguido delinear eventos que ocorreram imediatamente após o Big Bang e descobrir o maquinário bioquímico do cérebro, falha em explicar como a experiência subjetiva é criada."

"Então, por onde começa a solução? Os neurocientistas ainda não compreendem o suficiente sobre o funcionamento interno do cérebro para dizer exatamente como a consciência emerge da atividade química e elétrica dos neurônios. Assim, o primeiro passo é determinar os melhores correlatos neuronais da consciência (CNC) – a atividade cerebral que corresponde a experiências conscientes específicas."


Ou seja, o método científico ainda não vê uma luz para o grande problema de tecidos orgânicos ficarem conscientes. Tudo que se pode fazer é tentar encontrar os correlatos, ou os fenômenos cerebrais que estão relacionados ao surgimento da consciência. Uma simples busca de causa e efeito. Quanto ao que realmente significa a consciência, só esperanças.
Mais adiante, Greenfield assinala:

"Lembre-se de que nem Christof nem eu estamos tentando explicar como a consciência emerge. Não estamos tentando determinar como eventos fisiológicos no cérebro se traduzem no que você experimenta como consciência. Buscamos uma correlação – um meio de mostrar como fenômenos cerebrais e experiências subjetivas se encaixam – sem identificar o importante passo intermediário de como um fenômeno causa uma experiência."

Perceba a força dessa afirmação. Os dois cientistas defendem teorias sobre correlatos do surgimento da consciência, que são o que há de mais íntimo à idéia de experiência subjetiva que se pode identificar no atual estágio da neurociência. No entanto, eles admitem que não tentam explicar COMO a consciência surge..
O artigo então segue expondo as teorias dos dois cientistas, que divergem sobre onde os correlatos são realizados: se em um grupo único ou em vários grupos de neurônios. Para mim, a resposta verdadeira não influenciará muito a gravidade do problema maior de explicar a consciência; apenas dará uma seta para o próximo caminho, se ele existir.
É claro que isso representa a opinião de apenas dois cientistas. Mas você há de concordar, ao menos, que existem pelo menos duas pessoas de nome na área de neurociências com idéias semelhantes à minha, no que tange à situação da ciência com relação ao problema da consciência. A Scientific American costuma ser uma síntese dos diferentes paradigmas que existem em determinado campo; este foi um dos paradigmas.

sábado, 24 de novembro de 2007

A consciência é absurda

A consciência é absurda. É algo absurdo; como pode um conjunto de moléculas, agregadas como num jogo Lego, um conjunto de células trocando sinais químicos e elétricos, células essas que renovam a sua propria matéria ao longo dos anos (nossos neurônios não são formados pelas mesmas moléculas de quando tinhamos 8 anos de idade), ser consciente e sofrer sensações?
A consciência não é algo inerente a uma matéria específica. Ela é inerente à estrutura cerebral, à troca de informações entre os neurônios. Como é que uma simples troca de informações, ou um efeito dessa troca, como sugerem algumas teorias, pode fazer surgir um ser consciente?
Se ela é o resultado da troca de informações, então ela tem de estar contida em um meio. Tem de haver uma espécie de "hardware" que suporte esse "software" que é a consciência.
Quando falo de consciência, estou falando dessa propriedade "fantasmagórica" da matéria de "sofrer" sensações. Está aí: é você! Não importa se ela é o resultado de processamentos cerebrais, ela existe! E não pode ser explicada simplesmente com os nossos bizarros modelos da matéria. Como é que a matéria desperta para o mundo? Nem a tão esperada teoria final da física, que explicaria todas as forças da natureza, sequer sonha em explicar porque a consciência surge em aglomerados orgânicos baseados em carbono como os nossos.
Muitos materialistas não gostam das palavras fantasma, alma e espírito. Mas o fato é que existe algo de fantasmagórico no cérebro, algo que sofre e sente prazer, e essas palavras ao menos identificam esse elemento misterioso que está presente nele. Ainda que seja uma propriedade deconhecida da materia, ainda que seja um efeito desconhecido dela, ainda assim é algo incrível, espetacular, absurdo. Não gostou da palavra? A-b-s-u-r-d-o. Pela caridade, está na sua cara. Você está consciente, não está? Dizer que a consciência não é um mistério é uma falta de profundidade. E a ciência ainda não faz a menor idéia de como ela surge; o que existem ainda são teorias especulativas atiradas a esmo, ou conhecimentos sobre os processamentos cerebrais que levam à consciência.